Em Memória de Ladonna Brave Bull Allard

Uma grande líder, sábia, “insurgente histórica” (Amy Goodman), querida amiga e aliada, transitou de mundos e tornou-se antepassada. Estamos de luto pela morte de Ladonna Brave Bull Allard, cujo verdadeiro nome era Tamakawastewin (“A Boa Mulher da Terra” em Lakota), e curvamo-nos em profunda gratidão e respeito pela sua dedicação à defesa da água, da Terra, das pessoas — em nome de um mundo sem opressão e injustiça. Expressamos as nossas sinceras condolências aos seus familiares e entes queridos e rezamos pela sua transição para a luz.

A comunidade de Tamera

Fotografia: Ladonna Brave Bull Allard na acção de arte aérea contra a exploração de petróleo ao largo da costa Portuguesa, na praia de Odeceixe, Portugal, Agosto de 2017.

Sentimo-nos honrados e privilegiados por termos conhecido e trabalhado com Ladonna. Na sua enorme dedicação à defesa da vida, na profundidade da sua ligação com a Terra, a sua vida era expressão de uma oração. Como historiadora Lakota, ajudou a preservar e proteger a cultura e as memórias do seu povo, contra sucessivas tentativas de eliminação, protagonizadas pela cultura colonial branca. Como membro da Tribo Standing Rock Sioux na Ilha das Tartarugas (a terra a que hoje chamamos de Estados Unidos), foi profecia viva, ao abrir as portas da sua propriedade ao longo do rio Cannonball em 2016 para o primeiro campo de resistência contra o oleoduto de acesso ao Dakota, e ao co-iniciar um movimento histórico de protectores da água por todo o país e no mundo. O movimento tornou-se muito maior do que Standing Rock, tornando-se numa semente que germinou no mundo.

Na altura, Ladonna escreveu: “Este movimento não diz apenas respeito a um oleoduto. Não estamos a lutar por um reencaminhamento do oleoduto, ou por um processo mais justo nos tribunais do homem branco. Estamos a lutar pelos nossos direitos como povos indígenas desta terra; lutamos pela nossa libertação e pela libertação de Unci Maka, Mãe Terra. Queremos que cada último tubo de petróleo e gás seja removido do seu corpo. Queremos a cura. Queremos água limpa. Queremos determinar o nosso futuro. Não temos outra escolha senão quebrar este ciclo traumático, para que as gerações futuras possam viver uma vida melhor. Acredito que começa com a água e termina com a água. Água é vida. Juntam-se a nós?”

Como comunidade, seguimos de perto os acontecimentos em Standing Rock, em 2016 e 2017. O apelo à defesa de todas as águas e à oração encorajou-nos a enfrentar a ameaça de exploração de combustíveis fósseis aqui em Portugal. Continuamos imensamente gratos a Ladonna e a outros líderes indígenas do mundo inteiro que, na sequência do nosso apelo à solidariedade global, viajaram até Portugal para participar neste movimento, contra a exploração da Terra e por uma cultura global de cooperação. Acreditamos que o apoio político e espiritual de Ladonna foi crucial para o sucesso do movimento contra a ameaça de fracking e exploração de petróleo ao largo da costa portuguesa. Ela disse: “O mundo juntou-se a nós, por isso vim para estar convosco”. E ao vir até nós, Ladonna abriu um processo de reconciliação e cura profunda, atrevendo-se a pisar as terras de onde outrora partiram os colonizadores que tomaram posse das terras e vidas do seu povo. Ladonna partilhou mais tarde que acreditava que Portugal poderia produzir mudanças no mundo, caso fosse capaz de modelar um modo de vida regenerativo.

Através do encontro e da colaboração com Ladonna, a “Aliança Defender o Sagrado” evoluiu, juntando líderes indígenas, movimentos sociais e líderes comunitários do mundo inteiro. O exemplo de Ladonna, a sua visão e sabedoria, foram essenciais para a formação desta comunidade global que pratica activismo sagrado, ao serviço de uma mudança de sistema. A sua insistência em fazer da água a primeira e última causa, a autoridade do seu “Não” contra toda a opressão e injustiça, a solidez da sua solidariedade, a sua profunda sabedoria de ligação com a Terra, o seu humor e honestidade, ajudaram a fazer desta aliança o que ela é, e ajudaram toda uma nova geração de activistas e protectores da água a defender a vida. Que o seu legado viva através deles, através de nós e através de toda a Aliança Defender o Sagrado.

Como ela nos lembrou, “Não me interessa como rezas. Reza! E depois ergue-te em defesa do que é precioso para as gerações futuras. Se nos mantivermos juntos e nos capacitarmos, podemos fazer tudo”.

Sabine Lichtenfels, Dieter Duhm, Benjamin von Mendelssohn, Martin Winiecki, Vera Kleinhammes, Barbara Kovats, Aida Shibli e toda a comunidade Tamera

www.tamera.org