Aprendendo Com O Coronavírus: O Que É Possível Através Do Medo, Deverá Também Ser Possível Através Da Confiança

Leila Dregger, 16 de Março de 2020

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Graças ao coronavírus, a humanidade aprende algo de muito precioso. Aprendemos a força e a eficácia de algo incrivelmente pequeno, assim que tal se encontra em ressonância com um determinado campo latente. Neste caso, esta pequena unidade é um vírus. O campo latente é o medo — um medo enorme e colectivo do futuro: um ingrediente fundamental do turbo-capitalismo que se encontra à beira da desintegração global.

 

Actualmente, testemunhamos coisas que ninguém antes tinha conseguido alcançar; nem as greves climáticas ou acções ambientais dos últimos anos, nem as Nações Unidas ao longo de toda a sua existência, nem todos os esforços, ameaças, apelos, movimentos e cientistas, nem o Papa nem qualquer outra autoridade. Observamos acções determinadas e rigorosas em todos os continentes. Na indústria, no turismo, educação, desporto, etc. Em diversos países, vemos grandes áreas da vida pública serem encerradas. A humanidade está em pausa. E de súbito, os céus da China e da Itália voltam a clarear — a poluição do ar diminui dramaticamente — as pessoas ficam em casa e finalmente têm tempo para si próprias, para reflectir e contemplar, para pensar no que é essencial, para passar tempo com os seus filhos e com quem lhes é próximo. Em Itália, as pessoas cantam das suas janelas e varandas.

 

Qual será a causa de tudo isto? O que terá tanta força? Ouvimos teorias de conspiração sobre a origem do vírus, mas escolhemos deliberadamente não abordar estas questões neste texto. Se o novo coronavírus foi realmente transmitido de animais selvagens para o ser humano, podemos interpretá-lo como um impulso da natureza para que transformemos finalmente a nossa forma de vida.

 

Independentemente do vírus ser criação da mão humana ou do mundo natural, ele mostra-nos a fragilidade e a vulnerabilidade dos nossos sistemas globalizados, e a capacidade humana de transformar fundamentalmente o seu comportamento colectivo, literalmente, de um dia para o outro. Aproveitemos esta pausa para imaginar como poderá emergir uma transformação positiva das nossas sociedades. Como poderemos abastecer-nos daquilo que necessitamos — com quem poderemos cooperar — o que fazer quando os sistemas globalizados entrarem de facto em colapso?

 

Talvez no futuro olhemos para a crise desencadeada pelo coronavírus como um grande exercício colectivo, durante o qual iniciámos o desenvolvimento de sistemas comunitários e descentralizados, com os quais começámos a dar resposta às crises ecológicas e sociais. O medo e o pânico não são bons conselheiros. As qualidades que mais são necessárias nestes tempos de mudanças drásticas são a confiança, o apoio mútuo, a responsabilidade pelo todo, a flexibilidade e a confiança face ao imprevisível.

 

Algo permanece fascinante: a força inacreditável com que um vírus demonstra a ligação íntima entre toda a humanidade. Quando uma substância que se encontra presente nas nossas vias respiratórias, transmitida apenas mediante contacto directo, se espalha pelo mundo inteiro num espaço de poucas semanas, podemos dizer que estamos de facto unidos por um único fôlego.

 

Isto são boas notícias. Por que razão não poderemos também recorrer a esta íntima unidade da vida na Terra para iniciar um movimento positivo? O que é possível através do medo, deverá também ser possível através da confiança. De boca em boca, é possível também partilhar-se algo diferente de um vírus.

 

Acima de tudo, existe uma mensagem de esperança e certeza relativamente ao futuro: fazemos todos parte de uma grande comunidade de pessoas, animais, natureza e seres divinos, que juntos formam um todo unificado; que apoiam, ajudam, percepcionam e se complementam mutuamente. A Terra e a humanidade podem ser curadas num curto espaço de tempo — mesmo no estágio em que nos encontramos — assim que entendermos e aceitarmos a nossa verdadeira tarefa. O amor e a unidade são o elemento básico da aliança de todos os seres vivos — e isto são boas notícias.

 

O que será necessário para espalhar estas boas notícias com a rapidez que caracteriza a disseminação do coronavírus?

 

É necessário tocar na ressonância de um outro campo colectivo presente em nós, algo mais profundo que o medo — um campo ainda escondido actualmente. Trata-se de um campo colectivo de confiança, a matriz da vida, denominada “matriz sagrada” por Dieter Duhm. Apesar de todo o sofrimento, dos horrores do passado e de todas as ameaças, a vida ainda se move rumo à alegria, curiosidade e sobrevivência. Em cada um de nós, existe um núcleo que está ciente desta realidade. Este núcleo é a confiança. E por mais absurdo que pareça a quem se encontre agora face a precauções e restrições, esta é actualmente a nossa tarefa colectiva — fortalecer o campo da confiança através de tudo o que fazemos, pensamos e comunicamos, e através da forma como interagimos uns com os outros. Este é também o trabalho que fazemos ao desenvolver Biótopos de Cura: dissolver o trauma e o medo, activando esferas mais profundas de confiança. Esta será a fundação de uma nova cultura.

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